terça-feira, 5 de maio de 2009

OLHARES SOBRE O MUNDO ATUAL E A UTOPIA EDUCACIONAL


Por Prof Ms Jorge Ricardo Menezes da Silva

O mundo atual é, muitas vezes, um mundo de violência que se opõe as à esperança posta por alguns no progresso da humanidade. A história humana sempre foi conflituosa, mas há elementos novos que acentuam o perigo e, especialmente, o extraordinário potencial de autodestruição criado pela humanidade no decorrer do século XX. A opinião pública, através dos meios de comunicação social, torna-se observadora impotente e até refém dos que criam e mantém os conflitos. Até agora, a educação não pôde fazer grande coisa para modificar esta situação real. Poderemos conceber uma educação capaz de evitar os conflitos, ou de os resolver de maneira pacífica, desenvolvendo o conhecimento dos outros, das suas culturas, da sua espiritualidade.
Jacques Delors

Confesso que fiquei perplexo diante da análise estarrecedora dos “novos tempos” narrados na entrevista realizada pelo jornal O GLOBO com o traficante Marcola, líder do PCC, em 2006. Recebi o material na forma de slides de uma amiga educadora, gestora e proprietária de escola no Rio de Janeiro.

A razão da perplexidade é o da visão apocalíptica de nossa sociedade. Da nossa maneira de encarar e gerir os gargalos sociais ao longo de décadas. A grita social é de longa data. No entanto, nos fizemos de cegos, surdos, mudos e tetraplégicos, mesmo dotados de todas nossas possibilidades, porque simplesmente nos utilizamos da negação de que trata a teoria Freudiana, tentamos a todo momento não aceitar as realidades como fatos, fantasiamos o que nos perturba o ego. Marina Colasanti, diz em EU SEI, MAS NÃO DEVIA:

Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar o café correndo porque está atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra. E, aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E, aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E, não acreditando nas negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.
A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto. A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagar mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.A gente se acostuma à poluição. タs salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. タ luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. タs bactérias da água potável. タ contaminação da água do mar. タ lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.

Os resultados de décadas de ações políticas populistas e de assistencialismo sem sérias intervenções que mantiveram centenas, milhares e agora milhões na linha marginal da sociedade estão aí. Vamos continuar negando?

Como eu não quero e nem devo me acostumar, pego minhas armas, as palavras. E digo não a negação. Entendo que não fizemos o dever de casa. Não fizemos a manutenção necessária. Não corrigimos erros históricos e muito menos planejamos ações de curto, médio e longo prazo para que nossas cidades estejam preparadas para as transformações condicionadas pelo crescimento populacional e econômico.

Um exemplo atual desta problemática é a região da Costa Verde, no litoral sul do Rio de Janeiro. O porto de Itaguaí, a Companhia Siderúrgica do Atlântico são realidades, respectivamente, em revitalização e ampliação do potencial econômico do estado. Uma ótima iniciativa. Todavia, transeuntes agonizam por horas perdidas em um trecho relativamente pequeno, de poucos quilômetros, que já poderia ter sido sanado se a ponte sobre o canal de São Francisco, há anos com problemas estruturais tivesse sido consertada.

Fora isso, além da infra estrutura física, pergunto: será que a população de Itaguaí e regiões circunvizinhas tem recebido as melhorias qualitativas sociais que devam acompanhar o crescimento econômico?

Retomando a discussão inicial, saí da perplexidade, e vencendo a letargia que me acorrentava e o desejo de enterrar a cabeça, como uma avestruz, comecei a indagar e buscar respostas para minha ansiedade. Achei um caminho, reli a entrevista e encontrei uma pseudo cultura. Vi elementos que revelavam conhecimento, mas não sabedoria.

Reencontrei no meu eu e no nós, na educação o caminho para trilharmos e construirmos uma sociedade mais igualitária, mais humana. Lembrei o exemplo do quebra-cabeças, uma inspiração de COMO CONSERTAR O MUNDO, nos escritos de Gilberto Cotrim:

Um cientista vivia preocupado com os problemas do mundo e estava resolvido a encontrar meios de minorá-los. Passava dias em seu laboratório em busca de respostas para suas dúvidas.
Certo dia, seu filho de sete anos invadiu o seu santuário decidido a ajudá-lo a trabalhar. O cientista, nervoso pela interrupção, tentou que o filho fosse brincar em outro lugar. Vendo que seria impossível removê-lo, o pai procurou algo que pudesse ser oferecido ao filho com o objetivo de distrair sua atenção. De repente deparou-se com o mapa do mundo, o que procurava!
Com o auxílio de uma tesoura, recortou o mapa em vários pedaços e, junto com um rolo de fita adesiva, entregou-o ao filho dizendo:
Você gosta de quebra-cabeças? Então vou lhe dar o mundo para consertar. Aqui está o mundo todo quebrado. Veja se consegue consertá-lo bem direitinho! Faça tudo sozinho.
Calculou que a criança levaria dias para recompor o mapa. Algumas horas, depois, ouviu a voz do filho que o chamava calmamente:- Pai, pai, já fiz tudo. Consegui terminar tudinho!
A princípio o pai não deu crédito as palavras do filho. Seria impossível na sua idade ter conseguido recompor um mapa que jamais havia visto. Relutante, o cientista levantou os olhos de suas anotações, certo de que veria um trabalho digno de uma criança. Para sua surpresa, o mapa estava completo. Todos os pedaços haviam sido colocados nos devidos lugares.
Como seria possível? Como o menino havia sido capaz?
- Você não sabia como era o mundo, meu filho, então como conseguiu?- Pai, eu não sabia como era o mundo, mas quando você tirou o papel da revista para recortar, eu vi que do outro lado havia a figura de um homem. Quando você me deu o mundo para consertar, eu tentei mas não consegui. Foi aí que me lembrei do homem, virei os recortes e comecei a consertar o homem que eu sabia como era. Quando consegui consertar o homem, virei a folha e vi que havia consertado o mundo.

Mesmo diante das adversidades que nos impõem os sistemas educacionais, deixemos ecoar no nosso ser e agir docentes o que propõe o bom e velho Sêneca que tenhamos sempre em mente que somos responsáveis pelo bem que deixamos de fazer.

Fica a lição trazida por Daniel Goleman que devemos investir na alfabetização emocional da mesma forma em que investimos na alfabetização cognitiva. Fica a lição de Richard Wolman que devemos pensar com a nossa essência humana, a conciliarmos racionalidade e espiritualidade, entendendo a nossa complexidade transcendental que não pode ser matematizada, de forma aritmética, como muitos dizem, que somos razão e sensibilidade, criando porcentagens para isso. Tal ação é reducionismo.

Utopias? Sonhos? E porque não? O mundo é aquilo que fazemos dele.

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