domingo, 5 de abril de 2009

OLHARES SOBRE A PERPLEXIDADE DOCENTE E A FALTA DE ATITUDES

Por Prof Ms Jorge Ricardo Menezes da Silva

Primeiro eles roubaram nos sinais, mas não fui eu a vítima,
Depois incendiaram os ônibus, mas eu não estava neles;
Depois fecharam ruas, onde não moro;
Fecharam então o portão da favela, que não habito;
Em seguida arrastaram até a morte uma criança, que não era meu filho...


Claudio Humberto

Diante das adversidades vividas em nosso cotidiano, nós educadores temos duas opções: ou desistimos de vez e assistimos passivamente o ruir das estruturas sociais frente a erosão da família e a corrosão da escola, destituídas de valores sociais e intelectuais que alicercem questões básicas do convívio humano, tais como respeito, responsabilidade e solidariedade ou encaramos o problema, saindo do plano da perplexidade e mergulhamos em ações combinadas que visem contribuir com os processos de melhorias qualitativas dos cenários em que vivemos.

Precisamos assumir a realidade. Ficamos frequentemente diante da utopia de que os alunos deveriam se comportar passivamente diante da administração dos conteúdos. Atribuir a responsabilidade da gestão da sala de aula ao jovem é o mesmo que atribuir a gestão de sua casa ao seu vizinho. O problema é seu e você quer que os outros venham resolver? No máximo o que você poderá obter é orientações que te ajudem a solucionar suas questões. Não tenha plena certeza, não há verdade absoluta, construa sua verdade pois a verdade de outrem não necessariamente é a sua verdade. Cada turma tem sua dinâmica e este é um aspecto relevante. Reconstrua suas práticas diante da diversidade. As reconstrua em time, time de professores, cuidado com a arrogância:

Arrogância é um perigo porque ela altera inclusive nossa capacidade de aprender com o outro, de entrar em sintonia. Bons músicos não fazem uma boa orquestra a menos que eles tenham sintonia. E essa sintonia vem quando as pessoas respeitam a atividade que o outro faz e querem atuar de forma integrada.

Mario Sergio Cortella


Sala de aula não é ambiente de reprodução das lógicas impregnadas pela burguesia tais como submissão, autoritarismo, dogmatismo e competição. A sala de aula é ambiente que exige postura dialética porque esta é uma das exigências da contemporaneidade, do emprego da capacidade de dialogar para solucionar problemas e elaborar propostas de intervenção na realidade. Sala de aula é ambiente de protagonismo, de emergência da individualidade dentro da coletividade/diversidade, da universalidade dentro da multiversalidade.

Entretanto, o conteudismo crônico acentuado pela memorização de fatos e conceitos (saber) e a hipo valorização da aprendizagem de procedimentos e atitudes (saber fazer/saber ser/saber conviver) tem trazido a tona as ulceras de nossa sociedade. Antes a mãe fazia o papel de primeira educadora, conduzindo o infante a aprendizagem de conceitos, habilidades, hábitos e atitudes. Como a sociedade mudou, a mulher-mãe por uma questão de manutenção da saúde financeira familiar, ou de transformação do próprio seio familiar, terceiriza a educação no lar para a babá, tia, madrinha ou avó, ficamos de certa forma órfãos desta modalidade de educação, que outrora viria de casa, a das atitudes básicas.

Chegamos ao ponto que recebemos um público com altos índices de distorções comportamentais no que se refere ao relacionamento humano. Como fomos educados de forma diferente ficamos perplexos. Até então muitos de nós não saímos desta condição. Proponho aqui uma conscientização, o que deve se traduzir como a somatização da consciência mais a ação, ações corretivas, ações preventivas e ações preditivas, uma verdadeira engenharia de manutenção aplicada ao ambiente escolar, a sala de aula como espaço de transformação social.

A educação comportamental ou atitudinal deve estar revestida de educação em valores onde se estabeleça um contrato social instituído no currículo implícito ou oculto de nossas propostas pedagógicas.

O aprender a conviver tem como pilares a moralidade, a formação humana onde se busque a autonomia da pessoa como indivíduo e cidadão. Questões meta disciplinares, interdisciplinares e transdisciplinares como democracia, tolerância, aceitação ao pluralismo de concepções, saber ouvir são elementos de alta importância para a hominização, a nossa capacidade de nos conduzirmos de forma afetiva e social.

Ao educador cabe o estímulo a estas práticas, senão casos como os em julgamento no Brasil e no mundo, os Nardone, o de Suzane von Richthofen, frutos da animalidade e irracionalidade humana, continuarão a martelar nossas mentes junto com este artigo da Cosete Ramos editado em 2000, como presente(de grego) dado por alguns jovens de Brasília:

O filho comete uma, duas, três pequenas faltas.
O pai sabe. A mãe e os irmãos também.
A Família se cala. A Família consente.
E lá se vão os valores familiares...
O aluno comete um, dois, três pequenos deslizes.
Os colegas sabem. Os professores e a direção também.
A Escola se cala. A Escola consente.
E lá se vão os valores educacionais...
O jovem-cidadão comete uma, duas, três infrações menores.
Os membros da Sociedade sabem.
A Sociedade se cala. A Sociedade consente.
E lá se vão os valores sociais...
- Afinal quais são os limites? Tudo é permitido? "É proibido proibir"?
- Até aonde é possível ir? Vamos experimentar novas emoções?
- Que tal beber "quentão" na festa junina da escola? Que sensação!
Tudo bem. Podemos ir em frente. Nada aconteceu.
- E agora? Como vamos aprontar? Qual a próxima emoção?
- Apostar uma "pegadinha" no carro do papai? Que liberdade!
(Nas conversas em família e com os amigos todos comentam as peripécias do
adolescente: um verdadeiro ás no volante.)
Tudo bem. Podemos continuar. Nada aconteceu.
- E hoje? Qual a emoção do dia? O que fazer para passar o tempo?
- Jogar ovos nos transeuntes? Que massa!
- Mostrar o "bumbum" pela janela do carro? Que sarro!
- Pichar as paredes do bloco? Que sacanagem com os vizinhos!
- Puxar um "baseado"? Que êxtase!
- Quebrar os "orelhões" da Telefônica? Bom também!
- Dar tiros nas placas de trânsito? Melhor ainda!
- Espancar covarde e cruelmente uma moça, com certeza "uma prostituta", que
estava na parada de ônibus? Que sensação!
Tudo bem. Podemos avançar mais ainda. Nada aconteceu.
- E nesta madrugada? É preciso uma emoção diferente, a maior de todas!
- Qual? Olha ali, um mendigo deitado, dormindo na parada do ônibus!
- Vamos comprar álcool e fazer uma pequena fogueirinha?
- Só quero ver o pulo que o cara vai dar.
Um fala. Os outros calam. Todos consentem!
UM SER HUMANO VIRA TOCHA para despertar novas emoções nunca dantes
experimentadas,
por cinco jovens da classe média de Brasília, jovens que tudo têm, em um
país no qual a grande maioria nada tem!
UM SER HUMANO VIRA TOCHA para iluminar e tornar público o rosto de jovens
que há muito tempo haviam perdido a capacidade de amar. Ou, quem sabe, jovens
que nunca haviam aprendido a amar verdadeiramente. E não sendo capazes de
amar a si próprios, como ensina Cristo, também não são capazes de amar a
seu próximo, não importando de que credo, cor, raça, ou muito menos ainda,
condição social!
O momento do martírio pegou a Sociedade adormecida.
A Família estava calada. A Família consentiu.
A Escola estava calada. A Escola consentiu.
A Igreja estava calada. A Igreja consentiu.
O Governo estava calado. O Governo consentiu.
A Sociedade estava calada. A Sociedade consentiu.
O momento do martírio acordou todos os que dormiam.
O desatino, a insanidade e a impunidade haviam ido longe demais!
UM GRITO cheio de sentimento sai em uníssono da boca do povo brasileiro.
UM GRITO comandado pelos autênticos valores da cidadania.
- Basta. Não vamos ficar calados. Não consentiremos mais.
Outro grito de razão soa claro e urgente.
Outro grito comandando a inclusão de um novo item na Agenda da Nação
Brasileira
para o terceiro milênio.
- EDUCAÇÃO DE VALORES E EMOÇÕES JÁ!!
Na Família, na Escola, na Igreja, no Governo e em toda a Sociedade.


Concluo sob o prisma de Mahatma Gandhi que nos nos indica que devemos ser a mudança que desejamos ver no mundo.