sábado, 22 de novembro de 2008

OLHARES SOBRE A MEDIOCRIDADE NA EDUCAÇÃO

Por Prof Ms Jorge Ricardo Menezes da Silva

Demorei muito para me posicionar sobre esta temática. Demorei porque sei que vou cutucar nas feridas, porque vou revolver o pó assentado nos porões do comportamento humano. Para estimular meu raciocínio fui buscar elementos que me permitissem dialogar com os baluartes da filosofia, então, sem mais delongas vamos nós.

A mediocridade é argumentada de forma prosaica por Delacroix:

Não se tem idéia como abunda a mediocridade. (...) São pessoas como essas que travam sempre, em todos os lados, a máquina acionada pelos homens de talento. Os homens superiores são por natureza inovadores. Quando surgem deparam com o disparate e a mediocridade por todos os lados (ela que tudo domina e que se manifesta em tudo o que se faz). O seu impulso natural é assentar tudo de novo em terreno sólido e experimentar caminhos novos, para fugir a essa vulgaridade e parvoíce. Se por acaso eles triunfam e acabam por levar a melhor sobre a rotina, têm de ser ver as contas, por seu turno, com os incapazes - que fazem ponto de honra da cópia grosseira dos seus processos e estragam tudo o que lhes vem às mãos.
Depois deste primeiro movimento, que leva os inovadores a saírem das sendas já traçadas, segue-se quase sempre outro que os faz, no fim da sua carreira, conter o indiscreto entusiasmo que vai sempre demasiado longe e que, pelo exagero, arruína o que inventaram. Ao se darem conta do triste uso que é feito das inovações que eles lançaram no mundo, começam a elogiar aquilo que, afinal, graças a eles, foi ultrapassado. Talvez haja neles como que um secreto impulso de egoísmo, que os leva a tiranizar a tal ponto os seus contemporâneos e a considerar que só eles podem determinar o que deve ou não ser criticado. É a sua quota-parte de mediocridade; esta fraqueza fá-los por vezes desempenhar um papel ridículo e indigno da consideração a que conquistaram direito.


Ao efetuar esta leitura não pude deixar de lembrar de dois ícones da história da humanidade: Sócrates de Atenas e Jesus de Nazaré.

Sócrates de Atenas é considerado como o divisor de águas na história do pensamento ocidental, o que significa dizer que a filosofia se assenta em antes e depois de Sócrates. Entretanto, mesmo sendo um ser humano de inegável sabedoria cujos ensinamentos atravessam vinte e cinco séculos, mesmo sem ter escrito uma única palavra, foi acusado, julgado e morto por tribunais de seus contemporâneos. O objeto de acusação: corrupção da juventude.

Tudo porque Sócrates de Atenas promovia a avaliação reflexiva da existência humana e das ações mediado pela ironia, o que hoje chamamos de análise das causas e dos efeitos, objeto empregado como ferramenta na contemporaneidade como ferramenta da gestão da produção e manutenção industrial.

Jesus de Nazaré, conforme narrativas nos evangelhos têm uma trajetória meteórica, emerge no âmago de um processo conturbado sob o prisma sócio-político do povo judeu cujos líderes políticos e religiosos em nome de benesses junto ao jugo do Império Romano, colocavam o povo e suas necessidades biofísicas, sociais, psíquicas e espirituais em subplanos, atitudes em total desacordo com os textos do antigo testamento, escritos que registravam os parâmetros comportamentais a serem seguidos sob a égide teológica da fé judaica.

O próprio Jesus afirmou que não veio questionar a lei, veio cumpri-la, mas parece que cumprir a lei é algo que deixa as pessoas sob ameaça e uma vez ameaçadas atacam, violentam na moral e no físico, até mesmo matam. Neste contexto, Jesus também foi alvo de intrigas, sofreu perseguições, foi traído e abandonado, julgado, trocado por Barrabás e assassinado. Mesmo depois de morto ainda foi perseguido.

Como Sócrates, Jesus não escreveu uma linha. Entretanto, seus ensinamentos e profissão de fé por muitas vezes coloca nossas posturas pautadas em egoísmo e individualismo em cheque. Contudo, suas ações e menções romperam o limiar da teologia e seus modelos pedagógicos têm sido referência na gestão de pessoas neste início de século XXI.

Fica evidente que é um comportamento de natureza humana perseguir aqueles que nos remetem ao pensar o nosso agir. Em nome de uma moralidade hipócrita caçamos e executamos aqueles que provocam nossa reflexão, crucificamos e envenenamos mentes iluminadas para nos mantermos confortáveis dentro dos limites de nossa mediocridade.
O que me assusta é que as pessoas, mesmo aquelas formadas na academia, esquecem os rumos da história da filosofia e da teologia cristã, saberes que devemos dominar a fim de compreendermos o presente e esboçarmos um futuro mais humano.

Trago a baila argumentações que revelam nossa mediocridade, pequenez e visão limitada. A história de Maria Madalena, onde esta representa os excluídos, os rotulados, os julgados dentro da lógica classificatória, mecanicista, fragmentadora e disjuntiva, que fora acusada e condenada.
A sapiência Jesus fora questionada a respeito dos comportamentos de Maria Madalena e Jesus, com a sabedoria e simplicidade peculiar aos mestres, apenas exprime “aquele que não tem pecado, atire a primeira pedra”. Seria o mesmo que dizer “aquele que não erra que exclua”.

Em educação, o erro evidencia apenas o que fora aprendido de forma parcial ou não foi aprendido, deve servir para que o educador, o coordenador pedagógico e o corpo docente atuem em perspectivas de efetivar ensino de modo a promover aprendizagens que se revelam no conhecer, no fazer, no agir, no viver e conviver.

Contudo, dentro da lógica racionalista, o fato de ignorar um saber, seja de forma total ou parcial, em aspectos evidentemente cognitivos, tem servido de instrumento de discriminação e segregação e não como um instrumento de reflexão da própria práxis pedagógica, como se observa nas pedagogias liberais.

Em outra óptica, em um verdadeiro pedagocídio(neologismo aplicado por Hamilton Werneck), a promoção da aprovação automática, tem sido instrumento de reprodução da lógica burguesa das castas sociais. Quem é pobre, permanecerá pobre simplesmente porque dentro de uma postura irresponsável está se acentuando os índices de analfabetismo funcional, pessoas portando certificados de ensino fundamental sem dominar as competências e habilidades mínimas da norma culta da língua materna e das operações aritméticas básica. Cuidado com esta pseudodemocracia travestida de inclusão social, nos alerta o padre português Vasco Pinto de Magalhães:

O grande engano da mediocridade! Este é um alerta para os nossos dias. O fácil, o imediato, o que dá para todos, o que passa por democrático, o que está 'benzinho' e mediano, parece, tantas vezes, a solução. Não fazer ondas, ceder, ir pelo mais ou menos, vale tudo desde que não chegue cá o incômodo: este é o retrato dos desiludidos! Nivelar por baixo não é caminho, é engano.

A responsabilidade pela eficácia dos processos educativos é atribuição docente. Para que o docente seja capaz de agregar valores, conhecimentos, procedimentos, hábitos e atitudes se faz necessário que ele transmita automotivação de modo que os educandos se sintam “contaminados” pela importância de dominar os saberes disseminados em sala de aula.

Cabe ao educador tirar o educando da zona de conforto, mostrando ao mesmo o quão importante é dominar os conteúdos administrados para sua vida cotidiana, seja no campo pessoal, social ou laboral. Tirar da zona de conforto é importante parâmetro para mobilização das inteligências.
Infelizmente, mobilizar as inteligências tem sido parâmetro relegado ao segundo plano, pois o estilo bancário de educar e avaliar não permite a verificação complexa das competências e habilidades construídas pelo domínio dos saberes. Esta valorização enciclopédica formatada pela ditadura do conteúdo inibe a liberdade possibilitada pela construção dos conhecimentos.

Esta forma medíocre de educar e disseminar a cultura humana são agente nocivo no palco da laboralidade, uma vez que a atuação humana exige ações proativas, rapidez de raciocínio, apresentação de hipóteses de solução com viabilidade técnica, social, econômica e ambiental em situações de enfrentamento de problemas.

Para ser capaz de dispor deste cabedal de habilidades o educando deve dominar linguagens e compreender fenômenos o que significa que ele deva saber (dispor de elenco de saberes memorizados). Contudo, para argumentar e elaborar propostas, ele deve mobilizar estes saberes de modo a intervir na sua própria vida e na vida de outrem, o que significa que seu agir deve ser parametrizado pela ética, em total respeito à vida humana em todas suas vertentes: biológica, física, social, psicológica e espiritual.

Ufa!!!!!!!!!!!!!!!
Precisamos ou não romper com a lógica vigente?